Ao longo deste ano, temos trilhado uma jornada que nos convida a enxergar uma Igreja e uma comunidade sacerdotal. Para que essa comunidade sacerdotal se concretize, é fundamental que existam famílias sacerdotais. Contudo, não podemos ter famílias sacerdotais sem indivíduos que se reconheçam como sacerdotes. Todos nós somos chamados a essa vocação; ninguém está excluído desse chamado divino.
Ao exercermos nossa vida sacerdotal, é impossível não mencionar o “quarto secreto” — um espaço sagrado de encontro e intercessão. É nesse lugar que nos conectamos com Deus e buscamos entender o que Ele espera de nós. Somos homens e mulheres revestidos desse manto sacerdotal, e cabe a nós ocuparmos esse espaço. Para tanto, nosso coração deve ser devoto e nossa mente disciplinada.
Se não tivermos um propósito claro ao estarmos nesse lugar, ele perderá seu significado. O quarto secreto é um espaço de renovação e transformação, onde cultivamos o relacionamento com Deus e aprendemos a nos conhecer mais profundamente. No entanto, essa prática pode se tornar uma rotina, e muitas vezes enfrentamos a monotonia. E por que não reconhecer o tédio? Ele pode ser um sinal de nossa natureza carnal buscando distrações. O tédio revela a dificuldade de permanecermos na expectativa e na esperança que esse lugar nos proporciona.
Quero enfatizar que este lugar deve ser repleto da Palavra de Deus. É essencial que compreendamos que nossas vidas são consagradas para este lugar. Quando nos reconhecemos como consagrados, percebemos também que somos santificados para esse propósito. Somos santos ao Senhor, e ao entrarmos nesse lugar de espera — como Jesus nos ensina — Deus nos vê em silêncio e nos recompensa em segredo. Esse espaço não é apenas um local de espera, mas também um lugar de recompensas. Ao nos santificarmos para Ele, somos igualmente santificados por Ele.
A santidade ao Senhor é gerada pela Palavra. Precisamos entender que essa santidade é dinâmica em nossas vidas. Em Apocalipse encontramos a exortação: "Aquele que é santo, santifique-se ainda mais." Isso nos revela que a santidade é uma prática contínua, uma disciplina que se transforma em um estilo de vida. Portanto, somos chamados a viver em constante busca pela santidade diante do Senhor.
Para seguirmos adiante em nossa vida espiritual, como o próprio apóstolo nos ensina, é fundamental trabalharmos e desenvolvermos nossa salvação. Isso está intrinsicamente ligado à santidade ao Senhor. Um dos meios que o Espírito Santo usa para nos santificar é a Palavra de Deus. A Palavra de Deus é o meio de nos santificar.
Em Efésios, o apóstolo Paulo estabelece uma comparação entre a relação de marido e esposa e a de Cristo com a Igreja. Ele nos lembra que o sacrifício de Cristo — sua paixão e morte — foi realizado para que pudéssemos ser santificados. No versículo 26, ele afirma que somos purificados pelo "lavar da água por meio da Palavra".
Esse texto possui um profundo significado para nós. Dentro da tradição reformada, reconhecemos dois sacramentos: o batismo nas águas, que realizamos uma única vez, e a celebração da ceia do Senhor, que praticamos continuamente. Para nós, reformados e evangélicos, herdeiros da Reforma de Lutero, os sacramentos são compreendidos como o batismo e a ceia.
É interessante notar o comentário de Calvino sobre esse trecho. Ele diz: "Se a Palavra for afastada, todo o poder dos sacramentos se esvai. Todo o sentido dos sacramentos — tanto o batismo quanto a ceia — se perde. O que são os sacramentos senão selos da Palavra?"
Aqui, a "Palavra" se refere à promessa que explica o valor e o uso dos sinais, ou seja, os sacramentos. A Palavra é o meio pelo qual todas essas verdades se tornam concretas em nossas vidas. O significado do nosso batismo é plenamente revelado quando celebramos a ceia, e é através da Palavra que tudo isso ganha valor e propósito para nós. A purificação ocorre por meio da lavagem de água pela Palavra de Deus.
Estava refletindo sobre esse tema e me lembrei de uma palavra antiga: "macuco". Quando eu era jovem, entre 10 e 15 anos, costumava me envolver em atividades que me deixavam bem sujo. Ao voltar para casa, como todo adolescente esperto, fingia que havia tomado banho. No entanto, minha mãe sempre percebia e me levava de volta para o banheiro para uma limpeza de verdade, com água e muita esfregação. Às vezes, parecia que ela queria me lavar de tal forma que eu nunca mais repetisse as mesmas ações. Da mesma maneira, não podemos nos privar dessa limpeza espiritual. Quanto mais distantes estamos dessa purificação, mais longe ficamos da Palavra, e mais "sujos" nos tornamos. Muitas vezes, nem percebemos o quanto estamos imundos ou ignoramos essa realidade, acostumando-nos com a sujeira ao nosso redor.
Muitas vezes nos distraímos com outras coisas, mas a verdade é que, ao nos afastarmos da Palavra, acumulamos impurezas em nossas vidas, influenciados pelas coisas deste mundo. O mundo nos empurra a agir de maneira que desagrada ao Senhor, e as virtudes que Ele deseja cultivar em nós frequentemente ficam em segundo plano. Por exemplo, a humildade se torna escassa, pois o orgulho assume o controle, criando uma falsa sensação de proteção. Nos deixamos envolver pelas preocupações mundanas, adotando uma esperteza que nos impede de viver em amor com o próximo. Assim, começamos a nos afastar cada vez mais da essência da Palavra de Deus e a viver de maneira contrária ao que Ele nos ensina.
A Palavra é o meio pelo qual somos purificados. Ela não apenas transforma nosso comportamento exterior, mas também a maneira como nos comunicamos. Muitas vezes, a sujeira se revela em nossas conversas, através de palavras inadequadas e insultos. Como pode um cristão proferir palavrões? Isso evidencia um distanciamento da Palavra de Deus. Está escrito: "Irai-vos, mas não pequeis." As palavras que saem de nossa boca devem sempre edificar. No entanto, quando nos afastamos das Escrituras, acabamos imitando as expressões do mundo. Aqueles que falam de forma imprópria geralmente são os que não se dedicam à leitura das Escrituras. A maneira como Deus nos purifica é por meio da leitura e da prática de Sua Palavra. A Palavra é um espaço onde encontramos uma pessoa: Jesus.
Lembrem-se de João 5, quando Jesus exalta os doutores da lei, dizendo: "Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna"? Eles reconheciam a importância da Palavra, mas rejeitavam o Autor da vida. Jesus acrescenta: "São elas que testificam de mim." As Escrituras testemunham sobre uma pessoa, e essa pessoa é Cristo.
Quando entramos no quarto secreto, nos encontramos com Ele. Como saber se estamos realmente nos encontrando com Cristo? A Palavra nos lava e nos transforma. Jesus disse: "Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida." O lugar de encontro não é qualquer lugar; é um espaço de vida. O quarto secreto não é um local de isolamento para renunciar aos prazeres da vida. Pelo contrário, é o verdadeiro lugar do prazer genuíno, onde encontramos Deus que nos concede vida.
Quando chegarmos a esse lugar, é essencial estarmos profundamente imersos nas Escrituras. Ao entrarmos no nosso quarto secreto, a Palavra de Deus precisa ser parte intrínseca do nosso ser, e nosso coração deve estar transbordando dela. Muitos de nós têm acumulado água parada há dias, meses ou até anos, sem permitir que a Palavra flua em nossas vidas. E sabemos que água parada é prejudicial.
Devemos lembrar que o Senhor deseja nos oferecer algo novo todos os dias, assim como o maná no deserto. Não era permitido colher para dois dias; era necessário coletar apenas o suficiente para aquele dia. O maná guardado para o dia seguinte apodrecia e se enchia de vermes. Isso acontece porque Deus quer que busquemos Seu alimento diariamente. Não podemos nos contentar em pegar uma porção da Palavra para sustentar a semana; precisamos nos alimentar dela todos os dias! Quanto mais nos deixamos lavar pela Palavra, mais protegidos e renovados estaremos. O lugar de encontro é o lugar da lavagem do nosso corpo, da nossa vida, pela Palavra de Deus. João 1:1 nos lembra: "No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus." Quando carregamos as Escrituras no coração, estamos carregando o ressurreto de Deus.
Se você já fez algum curso ou faculdade, sabe que, se não colocar em prática o que aprendeu, essas informações vão embora. Isso fala muito da nossa condição humana. Precisamos sempre renovar nossa leitura, sempre estar comprometidos com a leitura das Escrituras Sagradas. A Palavra é o meio pelo qual Deus nos guarda deste mundo. É pela Palavra que não lutamos mais contra Deus, mas nos tornamos um com Ele. A Palavra é Deus. Quando estamos com as Escrituras em mãos, estamos com a pessoa de Deus. Como eu preciso dessa companhia! João 15:3 diz: "Vós já estais limpos pela palavra que vos tenho falado." Que palavra é essa? As Escrituras. Eles estavam limpos, como ramos prontos para dar frutos. E como acontece essa limpeza? Pela leitura das Escrituras.
Mesmo João, em João 17, nos revela que Jesus orava ao Pai e dizia: "Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade." Você deseja ser santo? Quer ser santificado? A resposta está clara: "Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade." Quantos de nós, talvez, estamos repletos de falsidade, falta de sinceridade e vivendo uma vida oculta, com segredos que nos envergonhariam se fossem expostos? Podemos alcançar a santificação pela verdade encontrada na Palavra de Deus.
E essa transformação não ocorre apenas pela Palavra que ouvimos aos domingos ou pelas mensagens do YouTube. Ela acontece através da leitura pessoal das Escrituras. É você, em comunhão íntima com Deus e com o texto bíblico, dedicando-se à leitura. Todos nós somos teólogos, de certa forma, chamados a compreender e examinar as Escrituras para discernir qual porção nos cabe. Todos nós.
À medida que nos alimentamos da Palavra e entramos nesse lugar de encontro, percebemos que essa prática se torna nosso verdadeiro meio de vida. Muitos podem ter rotinas que não incluem a leitura da Bíblia, mas nós somos aqueles cujo sustento é estar na presença de Deus por meio da Sua Palavra. O salmista afirma: "Guardo no coração as tuas palavras, para não pecar contra ti." Como podemos guardar a Palavra de Deus em nosso coração? Lendo-a continuamente.
Se você está vivendo em pecado, é um sinal de que a Palavra de Deus não faz parte da sua rotina. Quando ignoramos a leitura das Escrituras, nossa dieta espiritual fica deficiente. Quanto mais nos dedicamos à Palavra, mais nossas almas são lavadas, nossos corações purificados e nossas mentes transformadas. Nossa mentalidade se torna mais alinhada ao Senhor, pois eu amo a Palavra de Deus. Não podemos realmente amar ao Senhor sem também amar Sua Palavra.
Se não temos amor pela Palavra de Deus, estamos nos colocando em juízo, pois isso indica que não estamos amando a Deus como deveríamos. É um engano pensar que podemos amar a Deus sem valorizar Sua Palavra. Abraçar as Escrituras com todo o nosso ser é essencial para cultivar uma rotina de amor com Deus. Os que são casados sabem que o amor precisa ser constantemente nutrido. Se não cuidarmos do relacionamento, podemos estar fisicamente próximos, mas emocionalmente distantes; juntos, mas com os corações afastados. Essa realidade é bem conhecida e pode acontecer facilmente. Da mesma forma, nossa relação com o Senhor pode se tornar superficial se não a alimentarmos adequadamente.
É imprescindível que mantenhamos uma conexão profunda através da Palavra de Deus. Não podemos nos contentar com pequenas doses. Lembra-se de Pedro, quando Jesus quis lavar seus pés? Inicialmente, ele se opôs, mas ao perceber que essa ação era essencial para sua comunhão com o Mestre, pediu: "Lava não só meus pés, mas também minhas mãos e minha cabeça!" Essa é a compreensão que nós também precisamos ter da Palavra!
Embora seja válido ler em pequenas porções, devemos ter um apetite por mais. Tenha fome de Deus! Leia de quatro a cinco capítulos por dia; alimente-se da Palavra de Deus diariamente, em porções generosas. Assim, sua vida refletirá o testemunho de Cristo nas Escrituras.
O Salmo 119:12 nos ensina: "Induz o coração a guardar os teus decretos." Essa passagem nos revela a importância de direcionar nosso coração para guardar os mandamentos e a Palavra de Deus, não apenas por um tempo, mas até o fim de nossas vidas. O que realmente preenche nossas vidas é aquilo que temos em nosso coração. Se não forem as coisas deste mundo, como o trabalho ou as responsabilidades profissionais, o que então ocupa nosso tempo? É fundamental que sejamos desafiados a guardar a Palavra de Deus em nossos corações, orientando nossa mente, nosso olhar e nossas ações para esse propósito. Ao fazermos isso, podemos transformar não apenas nossa vida espiritual, mas também todas as áreas da nossa vida.
Dedicamos oito, nove ou até dez horas diárias ao trabalho para receber um salário que, muitas vezes, se esgota no final do mês. Por que não reservar ao menos uma hora por dia para o Senhor? Mergulhe na Palavra de Deus. Ore com a Palavra de Deus. Quando encontramos passagens como a de Efésios, onde Paulo ora: "Faço menção de vós para que o Senhor vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento d'Ele," podemos transformar isso em uma oração pessoal: "Senhor, concede-me espírito de revelação e sabedoria para que eu possa conhecer plenamente o Deus vivo." Ao fazer isso, estamos investindo tempo no relacionamento mais importante de nossas vidas.
Nossas orações se transformam quando estamos imersos na Palavra de Deus. As memórias que temos sobre as Escrituras só se fortalecem quando nos dedicamos a ler e reler a Palavra continuamente. Um salmo conhecido nos lembra: "Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e luz para o meu caminho." Caminhos retos são trilhados por aqueles cujo coração está mergulhado na Palavra de Deus. Ela ilumina nossa jornada, orientando-nos mesmo nas incertezas sobre a direção que devemos seguir. A Palavra nos coloca no caminho certo, de maneira clara e iluminada.
Frequentemente, podemos não nos conectar com determinadas pregações, não porque o pregador não seja competente, mas porque nós mesmos não estamos sintonizados com as Escrituras. Quando nos dedicamos a conhecer e aplicar a Palavra em nossas vidas, nossa capacidade de entender e absorver as mensagens se amplia significativamente. Se alguém se sente incomodado com o sermão, vale a pena perguntar quantas vezes essa pessoa lê a Bíblia por semana. Existe uma conexão clara entre a nossa disposição para ouvir a Palavra e o quanto estamos imersos na leitura das Escrituras. Quando a Palavra é pregada, ela vem para edificar e nos confrontar com aquilo que já está em nossos corações. Quando todos nós estamos mergulhados na Palavra, o que é pregado ressoa profundamente em nossos corações.
Já pensou que, se todos nós lêssemos a Bíblia juntos, seguindo o mesmo plano de leitura, estaríamos sintonizados com o que Deus está fazendo? Isso é totalmente possível! Virar as páginas da Bíblia em casa e compartilhar as Escrituras em família diariamente é a essência de um lar sacerdotal. Quando o texto diz: "Ensina o teu filho no caminho, e quando for velho, não se desviará dele," ele nos fala sobre o movimento constante das Escrituras dentro da família. No começo, pode ser um desafio. Ensinar os filhos e estabelecer uma rotina de leitura sistemática das Escrituras realmente exige esforço, mas é viável. Podemos ler a Bíblia em família, virando as páginas juntos. Será que o Senhor deseja isso de nós? Em João 14:26, Jesus nos lembra: "Mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito." O Espírito Santo nos guia à verdade e nos ensina tudo.
Quantos homens de Deus buscaram um lugar de encontro, de esvaziamento e mortificação da carne no quarto secreto? Quantas biografias conhecemos de tais homens? Hoje em dia, encontramos nas livrarias muitos livros sobre oração, muitos dos quais relatam as experiências profundas de homens e mulheres de Deus. Essas experiências aguçaram suas mentes e consciências. Um desses homens, ainda vivo, Paul Washer, testemunha que ao buscar a Deus desesperadamente durante seis ou sete meses, sua única oração era: "Senhor, disseste que se eu te buscasse, virias até mim." Ele orava assim diariamente, ajoelhado com um despertador ao lado para não adormecer. Após seis a oito meses, teve uma visitação tão impressionante que sentiu que toda sua formação espiritual veio à tona. A presença de Deus o marcou profundamente até hoje.
Não perdemos nada ao nos alimentarmos generosamente da Palavra de Deus todos os dias. O nosso encontro diário com as Escrituras é onde tomamos esse alimento santo e vivo. Santidade ao Senhor por meio da Palavra! Quando buscamos constantemente
Mensagem ministrada na Comunidade de Cristão Betesda na manhã de domingo em 22 de setembro de 2024 por Carlos Santos
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